3. As duas instrumentalidades: da natureza jurídico-instrumental do processo e da natureza instrumental da tecnologia

O processo eletrônico, mesmo realizado por meio físico especial,  tem a natureza jurídica de processo e qualifica-se como instrumento. À luz da teoria do processo o processo eletrônico é instrumental. Daí decorre a primeira das instrumentalidades mencionadas na idéia de  dupla instrumentalidade   a que se refere o princípio aqui proposto.

Considerando-se, por outro lado, que tecnologia vem de técnica e que técnica é “maneira, jeito ou habilidade especial de executar ou fazer algo”[1], deve-se considerar o processo eletrônico como um modo especial de fazer o processo. Disso decorre que, sob o aspecto tecnológico, esse modo do processo caracteriza-se também essencialmente pela instrumentalidade. Sua marca principal é o uso do meio eletrônico para a geração, armazenamento e transmissão/comunicação dos termos dos atos processuais.  Ademais, sob a ótica da teoria dos sistemas, deve-se considerar que o ingresso da tecnologia no sistema processual tem um objetivo de otimização e que, segundo estatui esse ramo teórico-científico, “[...]  no mundo real apenas são feitas sub-otimizações.”[2] [tradução livre]  Isso reforça a idéia de preservação do sistema do processo apesar do aporte tecnológico.

Assim, se o processo eletrônico é apenas e tão somente um modo (que vai se tornar preponderante, almeja-se!) de realização do processo,  a concretização desse “modo processual” deve ser posta, também, nessa perspectiva de instrumento a serviço do instrumento (meio que serve ao meio). Ou, aplicando-se uma segunda vez a idéia de instrumentalidade negativa fornecida pela teoria das nulidades, pode-se representar esquematicamente assim a disposição dos elementos mencionados:

            


Daí que o processo eletrônico – no sentido de processo realizado com incorporação dos avanços da tecnologia da informação -  é marcado por essa dupla caracterização instrumental ou de meio. No esquema acima, olhando-se de baixo para cima, tem-se que: (i) num primeiro passo, o instrumento tecnológico é incorporado para a otimização do sistema processual, que é a via pela qual a tecnologia, mediatamente, é posta a serviço do Direito e (ii)  num segundo passo, e imediatamente, o processo eletrônico, pela sua natureza processual, serve ao Direito, a serviço do qual está posto todo e qualquer modo  de realização do processo.  Em termos de força, a tecnologia situa-se num patamar de força mais fraca, devendo ceder às forças do sistema processual e do Direito.



[1] FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário aurélio eletrônico século XXI.
[2] Texto original: “[...]  in the real world only suboptimizations are performed.” DANIELS, Alan; YEATES, Donald.  Systems analysis.  Palo Alto:SRA, 1971. 258p.